domingo, 29 de março de 2009

Era algum lugar...

Era pra ter ido num horário, mas fui em outro.
Era pra ter alguém me esperando no aeroporto, mas não tinha.
Era pra ter tido um trabalho, mas tive outro.
Era pra ter sido num lugar, mas foi em outro...

Eu não sabia muito bem onde estava realmente, mas eu estava adorando aquilo tudo, apesar de ter sentido a ira dos macacos selvagens locais.

Tudo o que soube no final é que estava em algum lugar nas redondezas de Delhi.



segunda-feira, 16 de março de 2009

Monotonia?

Quantas vezes, quando nos perguntam "como estão as coisas", respondemos que está "tudo igual"?!

Cansado de responder com certa frequência essa pergunta, resolvi prestar mais atenção num caminho simples, de 10 minutos, que faço diariamente para a academia e percebi que as coisas apenas "seguem iguais" àqueles que são incapazes de perceber a vida ao seu redor.

*****

Sábado, 17:00 horas. Sozinho em casa, sem ninguém na net pra papear e nada de muito importante pra fazer, resolvi ir para a academia "passar o tempo". Comi algo rápido, peguei meus acessórios e me arrastei pra fora logo, antes que a preguiça me alcançasse. Fui pela escada, descendo de dois em dois degraus.

Na portaria do meu prédio, vi que haviam mais "porteiros" que o comum, em torno de 10. Alguns conversavam entre si, outros mexiam em seus celulares, outros apenas cochichavam enquanto eu passava. Cumprimentei os mais simpáticos ("coincidentemente", os que não estavam presentes na noite que espancaram o tal rapaz - os que participaram, não faço questão de olhar mais na cara *vide post Um Caso de Polícia? para entender*) e segui meu caminho.

Fui desviando das pequenas poças de "água" que inundavam a rua naquele momento, devido ao tradicional esquema de saneamento. Entre um pulo e outro, uns respingos na perna me deixaram meio enojado.

Cheguei à esquina já logo acenando para o sapateiro, um indiano simpático que arruma os calçados ali mesmo, debaixo de uma tenda improvisada. Logo a sua frente, um casal de pedintes estendiam as mãos para que as pessoas lhe jogassem uns trocados.

Alguns metros depois, alcanço o cruzamento onde quase sou atropelado diariamente, tamanho é sua "sinalização" (????). Assim que chego ao outro lado, escuto um barulho: um acidente entre um ônibus e um carro. Curioso, dei meia-volta para acompanhar o desenrolar dos fatos.

O motorista do carro, enfurecido, deixa seu veículo no meio da rua (atrapalhando mais ainda o já atrapalhado trânsito) e invade o ônibus à força. Xingando, pega o motorista do ônibus pelos braços e o chacoalha, até que alguém aparte. Àquela altura, uma multidão já havia cercado o veículo público para bisbilhotar e as buzinas, pressionadas pela fila de carros que se formara querendo passar, se tornaram mais estridentes que o normal.

O rolo todo terminou em cerca de 15 minutos. O motorista do carro anotou os dados do ônibus e partiu, mas seus passageiros, apressados, já haviam desocupado o veículo e seguido em outro.

Sigo pela viela pobre até chegar a um caminho de terra. Ali, crianças jogavam bolas de gude, enquanto outras se divertiam com o críquete, um jogo parecido com o basebol. Um cheiro de comida invadia o ar, me deixando com fome. Mais a frente, uma vira-lata gorda, mais parecida com uma leitoa, dormia na sombra de uma árvore.

Depois de virar algumas esquinas, vi uma ratazana servindo de comida para os inúmeros corvos que a petiscavam. Quando passei, olhei para aquele bixo feio amassado, que mais parecia um tapete, provavelmente, atropelado por algum veículo.

Finalmente, chego na academia.

*****

Viu? Nem tudo está como parece! Agora, eu é quem pergunto: "E por aí, como estão as coisas, tudo 'igual'?" ;)

sábado, 7 de março de 2009

Um dia improvisado - em Nova Déli

Já estava tudo mais do que planejado: seriam dois dias de trabalho e um dia livre para ir até a cidade de Agra, onde encontra-se o todo belo Taj Mahal.

Ticket na mão, máquina carregada, quarto alugado, informações sobre os ônibus e estações, empolgação a mil, ... tudo mais do que certo nessa minha ida à Nova Déli. Porém, desencontros e demais imprevistos cancelaram um dia de trabalho, encurtando minha estadia na capital indiana.

Triste com a perda de um trabalho e feliz com a possibilidade de conhecer o Taj Mahal mais cedo, resolvi conferir as informações com o recepcionista do "muquifo" que me abrigava. O papo, cheio de mímicas e rascunhos no papel, fluiu super bem até que ele me perguntou quando eu iria. "Amanhã no primeiro ônibus", respondo. Parecia que não ia ser dessa vez, novamente! Sexta-feira é o único dia da semana que o Taj Mahal não abre.

Eu não pensava em outra coisa a não ser socar minha cabeça na parede ali mesmo, na frente de todos. Que dias! Decepcionado, subi para meu quarto e tomei um banho morno num chuveiro que despejava poucas gotas de água, umas aqui, outras ali. Estava tão exausto que fui dormir sem pensar o que faria no dia seguinte.

Acordei sem pressa de levantar e pensei em como salvar aquele dia, sem trabalho e, agora, sem Taj Mahal. Desci até a recepção e peguei um mapa. Comprei umas bananas na rua e um suco de manga e subi novamente para meu quarto. Tomei meu café-da-manhã em cima da cama bagunçada enquanto traçava um passeio no verso de uma página tirada de uma revista. Desta vez, queria misturar lugares belos com algo mais cultural, onde pudesse gastar um pouco mais de tempo.

Com a ajuda do simpático e sempre atencioso recepcionista, consegui contratar um taxista particular a preço de bananas. Expliquei o roteiro e saímos debaixo do sol escaldante num carro velho e sem ar condicionado, óbvio.

Reservei a primeira parada para a qual seria a mais especial, uma espécie de Memorial de Gandhi. Naquela casa, chamada de Birla House, foi onde o pacifista mais reconhecido do mundo passou seus últimos 144 dias até ser assassinado por um radical.



A casa, rodeada de belos jardins, estátuas e mensagens do homem que conseguiu a independência da Índia, é dividida em dois campi; um funciona como um tipo de museu, onde cada cômodo explica sua vida passo a passo, desde seu nascimento, das mais variadas formas (vídeos, maquetes e quadros ilustrativos); o outro é dedicado às pesquisas e funciona como um centro de estudos.


O que mais me chamou atenção foi o último caminho percorrido por ele antes de ser assassinado, exposto em alto relevo, até o local onde realizava suas orações, momentos antes de ser baleado. Há uma placa sinalizando o local de seu martírio.



Feliz por ter tido a oportunidade de conhecer um pouco mais sobre esse homem que estampa as cédulas indianas, parti para o Portal da Índia, monumento criado para homenagear os soldados mortos na Primeira Guerra Mundial. Os nomes dos 90.000 soldados mortos em combate estão inscritos nas paredes do Portal de 42 m de altura.


Mesmo derretendo debaixo do sol forte que fazia, resolvi caminhar um pouco pelos enormes jardins que rodeam o monumento e vi inúmeras pessoas se aglomerando às sombras das árvores para comer, brincar, namorar, ...


O sol estava de "rachar coquinho". Com apenas três bananas, um suco, um picolé e um pacote de bolachas no estômago, resolvi voltar para o carro a fim de agilizar o meu passeio. Parti logo para o Parlamento Indiano e o Palácio Presidencial.

O queixo começa a cair à medida que você se aproxima desse lugar incrível. A sensação é de estar adentrando castelos da era medieval. A arquitetura é ... indescritível (*fui impedido pelo meu bom senso de tentar descrever).



É ali onde funciona os principais ministérios do Governo Indiano. Os carros comuns não podem estacionar, apenas os autorizados. Mas, digamos que, eu saí algumas vezes do taxi correndo para tirar umas fotos, enquanto o taxista fugia dos apitos frenéticos da segurança (coitado!). Ah, não aceitei a idéia de estar ali tão perto e não poder ter um tempo para apreciar aquilo.




Depois de pedir desculpas aos guardas, fui até o portão do Palácio Presidencial, chamado de Rashtrapati Bhavan. Acho que foi uma das coisas mais *%^)#)$(%*#&^* que já vi.



Cansado, com fome, derretendo e ainda boquiaberto, pedi para que meu motorista tocasse adiante. Próxima parada, SafdarJumg's Tomb.

Depois de pagar o preço estipulado a gringos para visitar esse lugar, o local me lembrou em muito o Taj Mahal. Primeiro, porque também é um mausoléu; segundo, que suas estruturas são bem similares.



Pelo pouco que li, esse é o lugar onde a tumba de Safdarjung se encontra, o primeiro ministro e "braço direito" do imperador Muhammad Shah.



Não sei se era devido ao sol forte ou se é pura falta de interesse, mas eu era o único visitante daquele lugar naquele momento. Claro que, mais uma vez, a arquitetura me impressionou. Enquanto contemplava admirado a arquitetura e o visual que o cerca, vi que três seguranças riam das minhas tentativas inúteis de me auto fotografar à frente do prédio. Pedi para que, então, tirassem uma foto de mim ali só para constar. Um "saiu de fininho", o outro preferiu sair na foto.



Já eram quase 17 horas quando olhei para o relógio do celular antes de ir embora. Imaginei o pobre taxista me esperando dentro do carro derretendo dentro de seu turbante. Resolvi voltar para o meu "hotel" e fazer o "check-out" mais cedo.

Parado no trânsito a caminho do aeroporto, refiz mentalmente todos os passos que dei naquele dia, meio improvisado. Incrível como nada saíra como o planejado, mas que também não havia sido tão ruim assim.

Ainda não foi desta vez que conheci o Taj Mahal, mas se toda vez que eu chegar perto dele, ele me oferecer tantas opções à minha volta, vou continuar sendo grato pela oportunidade de alcançá-lo um dia.

domingo, 1 de março de 2009

Novos caminhos, novas descobertas

Numa manhã de sexta-feira, acordei com a sensação de fazer algo diferente assim que abri meus olhos. Sem pensar muito, pulei da cama, troquei minha roupa e comi algo para calar a boca do meu estômago faminto. Aliás, em dias de "férias forçadas", não tem me sobrado muitas opções além de comer e ficar sentado à frente da televisão o dia todo (a grana curta me impede de dar uns rolés fora do subúrbio).

Assim sendo, resolvi que naquela manhã iria dar uma volta a pé. Peguei minha câmera e saí sem rumo, sem saber pra onde iria ou em quanto tempo voltaria. A única coisa que queria era andar por ruas que eu não havia passado ainda na minha redondeza.

Na rua principal, onde contém a feira e o armazém que nos oferece frutas e alimentos "diversos", sempre ia até uma determinada banca e voltava. Naquele dia, resolvi ir além e ver até onde aquela rua me levaria. Fui até o fim dela através de uma rua sem asfalto em meio a uma viela com barracos e casebres pobres pelos dois lados. Nas partes mais largas, haviam cortiços precários com crianças jogando "cricket" em meio aos entulhos.

O fim da rua me levou a um terreno enorme onde indianas estendiam peixes no chão para secar. É comum, em toda Ásia, o consumo de alimentos secos, sejam frutas ou carnes. O problema é o modo de preparo: os alimentos estão em contato direto com a areia sem nenhuma proteção e estão ali expostos em meio a corvos e vira-latas. O cheiro é de carniça "fresca".




Voltando dali, entrei por outra rua. De longe, vi uma estrutura que parecia ser de uma igreja e resolvi ir até lá. Chegando mais perto, vi que realmente se tratava de uma igreja católica. Passei pelo portão principal e andei um pouco pelo pátio, onde havia imagens de Jesus crucificado, entre outras. A poucos metros dali, à minha esquerda, havia um templo hindu.


Agora que já tinha conhecido o outro lado e descoberto de onde vinha o cheiro podre que invade meu apartamento todos os dias, resolvi voltar para casa ainda por um caminho diferente. Segui em direção a uma favela que se situa à beira-mar e vi uma espécie de "calçadão" sendo construído. Entrei pelo beco e fui ver o mar durante uns minutos. Dois homens que pescavam numa espécie de jangada notaram a presença do branquelo aqui (eu) e começaram a fazer graças, pulando e virando cambolhotas naquele mar preto. Resolvi me retirar para que eles continuassem trabalhando sem que eu os distraísse.

Quando comecei a voltar, um trio de homens simpáticos sentados à frente de seus barracos puxaram conversa comigo. Depois de mímicas e deduções, entendi que eles queriam que eu os fotograsse e mostrasse suas imagens pra eles mesmos. Pedido feito e umas risadas depois, parti pelo calçadão.



Enquanto caminhava, me surpreendi com a construção de uma mesquita. Na verdade, sempre que ia para o andar de cima no apartamento de uns amigos, via de longe algo iluminado e ficara curioso com o que seria aquilo. Agora, estava vendo de perto a construção ou reforma daquele lugar que enfeita o céu de verde todas as noites.



Embora o sol estivesse forte, resolvi não voltar para casa. Decidi caminhar pela rua que frequento diariamente de riquixá. Dentro do triciclo, era meio difícil ver a variedade do comércio que tinha naquela rua. Salões de cabelereiros, bancos, lojas de roupas,... me impressionei como nunca tinha prestado atenção em todas as coisas que estavam ao meu redor.

Andei pela rua até que minhas pernas começassem a se queixar. Achei um praça abandonada em frente a um "mini parque" bem cuidado onde algumas pessoas faziam suas caminhadas. Tentei fotografar, mas um segurança me impediu dizendo que eu teria que pagar alguma taxa. Idiota!

Quando estava começando meu caminho de volta, passei em frente a uma "barbearia" e ao lado de uma vaca que devorava uns restos de lixo que estavam jogados no chão. A cena me fez rir.



Olhei para o relógio do celular e vi que uma hora e meia havia se passado. Eu ainda estava empolgado com o passeio matutino, mas tive que voltar. Cheguei em casa decidido que todas as manhãs agora seriam como aquela, cheias de novos caminhos e novas descobertas.